Os Oito Odiados




SINOPSE 
Durante uma nevasca, o caçador de recompensas John Ruth está transportando uma prisioneira, a famosa Daisy Domergue, que ele espera trocar por grande quantia de dinheiro. No caminho, os viajantes aceitam transportar outro caçador de recompensas, Marquis Warren, e o xerife Chris Mannix, prestes a ser empossado em sua cidade. Como as condições climáticas pioram, eles buscam abrigo no Armazém da Minnie, onde quatro outros desconhecidos estão abrigados. Aos poucos, os oito viajantes no local começam a descobrir os segredos sangrentos uns dos outros.




"De mãos dadas chegaremos lá."

Quentin Tarantino é um diretor e roteirista muito popular, conhecido por inserir várias assinaturas pessoais e referências sobre o ofício do cinema em seus filmes. Uma das principais características de suas produções é a quantidade de diálogos longos e aparentemente irrelevantes, até que se provem o contrário. Os Oito Odiados (The Hateful Eight), além de ser seu maior filme até agora, é também sua obra em que essa característica aparece com maior expressividade.

Escrito e dirigido por Quentin Tarantino, o filme conta com nomes como Samuel L. Jackson, Kurt Russell, Jennifer Jason Leigh e Tim Roth em seu elenco. A fotografia é dirigida por Robert Richardson, enquanto a trilha sonora é orquestrada por Ennio Morricone. O filme foi montado por Fred Raskin.

Sendo conhecido por fazer filmes sobre filmes (mesmo que esse tema não seja o principal), a metalinguagem e a autorreferência são peças-chave durante toda a filmografia de Tarantino. Existem, inclusive, teorias que afirmam que alguns dos filmes dele se passem em um mesmo universo, como o curta-metragem brasileiro Tarantino's Mind. Ao assistir o longa até chega a passar pela cabeça do espectador que o "Oito", presente no título, fala mais sobre o fato de ser o oitavo filme da carreira do diretor do que o número de pessoas naquela cabana. Talvez por essa característica, o diretor segue a contramão de seu faroeste Django Livre e retorna às suas origens, com um filme de uma só locação, lembrando sua estréia com Cães de Aluguel, mas com um toque a mais: o filme também é uma enorme homenagem a O Enigma de Outro Mundo, de John Carpenter (que também tem atuação de Russel e trilha de Morricone).


Sendo teoricamente desconectado às noções tradicionais de protagonistas e antagonistas, Os Oito Odiados é um grande trabalho de estudo de personagens. Ao colocar várias pessoas nefastas em uma mesma cabana cercada de neve, o filme dedica sua primeira hora inteira a explicar os motivos para deixar bem claro para o espectador que nenhuma daquelas criaturas merece o mínimo de confiança (mesmo que algumas sejam dignas de empatia, por determinadas razões). A impressão é de que sobra filme nas três horas de duração, mas o enredo se esforça bastante para provar o contrário, considerando o quão bem conhecemos aquelas pessoas.

O grande mérito de Tarantino é conseguir fazer um filme de quase três horas, com apenas uma locação e muito diálogo para pouca ação, durar menos tempo que isso para quem assiste e ainda deixar o espectador na ponta da poltrona. Ele construiu a armadilha perfeita: uma cabana na qual não se sabe se o lado mais perigoso é o de fora, com uma nevasca mortal, ou o lado de dentro, em um ninho de cobras. Isso é muito bem feito, considerando principalmente a trilha incrível e misteriosa de Morricone, os som ameaçador dos ventos do lado de fora e o texto incrível de Tarantino, potencializado pelas ótimas atuações do elenco.

O humor funciona muito bem, mas de forma muito sombria. São feitas piadas racistas, homofóbicas, misóginas e xenofóbicas, mas que sempre preparam muito bem o espectador antes de aparecer. Além disso, o conteúdo absurdo do texto é fundamentado no fato de que todas aquelas pessoas são, em teoria, odiáveis e acabam nos deixando ainda mais desconfortáveis com aquela situação (e com a nossa própria reação às piadas, quando percebemos o que estamos fazendo). Momentos assim funcionam quase como uma versão boa dos filmes do Adam Sandler.


A duração é um fator que talvez afaste algumas pessoas. As quase três horas, representadas pelo início extremamente lento (mas que não deixa de ser interessante), podem acabar assustando um pouco os espectadores que procuram apenas se divertir com as cenas prometidas no material promocional do filme. Por outro lado, o simbolismo atrai logo de cara aqueles que procuram algo mais. A imagem de madeira de um Jesus crucificado, com um monte de neve formando um gorro branco em sua cabeça (te lembra alguma coisa?), logo nos primeiros segundos, representa muito bem o que está por vir.

Apesar de suas falhas (ou por causa delas?), Os Oito Odiados é um grande filme (quero usar essa piada faz tempo!). Seu texto é muito bem fechado, a trilha sonora de Morricone é incrível e mesmo algumas coisas que parecem injustificáveis, como a narração de Tarantino, merecem uma segunda observação, mais atenta que a primeira (como a própria narração do diretor vem mostrar). Não chega a ser uma aula de cinema, mas não deixa de ser um bom Quentin Tarantino.
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