Baseado em uma história real, o drama mostra um grupo de jornalistas em Boston que reúne milhares de documentos capazes de provar diversos casos de abuso de crianças, causados por padres católicos. Durante anos, líderes religiosos ocultaram o caso transferindo os padres de região, ao invés de puni-los pelo caso.
Filmes que giram ao redor de histórias reais geralmente trazem em si um grande valor histórico, principalmente os jornalísticos. Se um filme é o retrato de uma época, então um que fale sobre jornalistas reais provavelmente vai representar ainda melhor aquela realidade, à medida em que ela vai sendo descoberta pelas pessoas cujo trabalho estamos assistindo. Spotlight - Segredos Revelados (Spotlight) reforça esse ponto em caráter de excelência.
O roteiro é escrito por Josh Singer em parceria com Tom McCarthy, que também é o responsável pela direção do filme. Entre os principais nomes, estão Mark Ruffalo, Michael Keaton, Rachel McAdams e Liev Schreiber. A fotografia foi dirigida por Masanobu Takayanagi, enquanto os créditos da música são de Howard Shore e o design de produção fica a cargo de Stephen H. Carter.
Spotlight trata, antes de tudo, de sacrifício. Mesmo que a trama principal gire em torno do abuso e da corrupção ética dentro da igreja católica, o filme mostra os constantes sacrifícios envolvidos nas vidas das pessoas durante o processo de criação da reportagem: sejam as vidas pessoais delegadas a segundo plano, seja o sacrifício da Fé pela Verdade ou até mesmo do detrimento da ética de algumas pessoas em função da publicação de uma história sobre disfunções éticas e morais (a ironia, aqui, é tão trágica quanto inevitável).
A partir de um ponto de vista metalinguístico, a história que o filme apresenta é praticamente tão absurda quanto a que o próprio jornal tenta publicar. Eu imagino que para pessoas que tenham uma ligação forte com a Igreja, por exemplo, a mensagem que ele traz deva ser extremamente desconcertante. Não à toa, o que assistimos leva o mesmo nome que a equipe responsável pela investigação da matéria.
A direção de McCarthy funciona muito a favor da narrativa, não deixando os aspectos técnicos falarem mais alto do que a trama, em si. Mas isso não o impede de ser inventivo, principalmente considerando que está em muito boa companhia. A maior evidência disso é um plano que começa fechado em uma mesa, rodeada com os jornalistas da Spotlight entrevistando um especialista pelo rádio, e que vai se abrindo e mostrando uma sala cada vez maior, à medida que vamos sendo apresentados à dimensão do problema.
A melancolia das vítimas dos abusos, chamadas de "sobreviventes" (o que diz muito sobre o dano irreversível causado às vidas dessas pessoas - algumas, inclusive, optando por encerrá-las mais cedo) é um fator constantemente adicionado ao filme, principalmente através das composições de Howard Shore. A trilha sonora nos lembra, o tempo todo, da dor que vemos nas entrevistas, sempre cheias de vergonha, medo e tristeza.
O design de produção também é excelente. Ambientado em 2001, quando a internet alcançava um espaço cada vez maior, consequentemente absorvendo cada vez mais o dos jornais impressos, o filme apresenta vários cenários cheios de papéis sujos jogados para todos os lados, como se mostrasse o quão obsoleto era aquele estilo de vida frente à inovação tecnológica que estava à sua disposição.
Para começar o ano com o pé direito (aqui no Brasil, uma vez que o filme estreou lá fora ano passado), Spotlight carrega em sua qualidade um colírio para os olhos, mas oferece um gosto amargo em seu pessimismo e suas ideias, reforçado pelo desprazer que vem junto a lembrança de que o longa se baseia em fatos reais.