007 Contra Spectre

Spectre
SINOPSE
Uma enigmática mensagem do passado de James Bond o coloca numa investigação sobre uma misteriosa organização criminosa. Enquanto M enfrenta duras batalhas políticas para manter o serviço de inteligência funcionando plenamente, Bond dedica-se a desvendar o que é Spectre.

"Os mortos estão vivos."

Estas são as primeiras palavras impressas na tela, iniciando nova aventura de James Bond, 007 contra Spectre (Spectre). A princípio, o significado destas palavras não é claro mas promete muito, considerando o nível da história anterior, Skyfall. Esta promessa é ainda mais reforçada pela cena de abertura, ambientada na comemoração mexicana do Dia de los Muertos e embalada por um plano-sequência impressionante. É uma pena que, logo nesta mesma cena, comecemos a ter alguns sinais de que as coisas não serão tão boas assim.

O roteiro é escrito por John Logan, Neal Purvis, Robert Wade e Jez Butterworth e dirigido por Sam Mendes. Os principais nomes no elenco são Daniel Craig, Christoph Waltz, Léa Seydoux, Ralph Fiennes e Monica Bellucci. A fotografia é dirigida por Hoyte Van Hoytema e a música fica a cargo de Thomas Newman.

Uma ficha técnica assim é de, no mínimo, levantar algumas sobrancelhas (seja de animação ou de suspeita). Daniel Craig entrega, provavelmente, o seu pior James Bond em todos os quatro filmes. Não existe nenhuma complexidade em sua atuação, nem sequer um esboço do que chegou a entregar em Skyfall e Cassino Royale. Infelizmente, o resto do elenco segue a mesma frequência: Christoph Waltz, cujo nome é a maior promessa do filme, entrega um vilão que não passa de uma repetição mal feita de seu icônico Hans Landa e Léa Seydoux reproduz a confusão de sua personagem mal escrita, perdida entre ser uma mulher forte e uma garota mimada.


As aberturas dos filmes do 007 são, provavelmente, tão importantes quanto os próprios filmes. Existe um buzz muito grande envolvendo os artistas convidados, as músicas compostas e a discussão sobre a forma com a qual se dá a relação do clipe com a história do filme. Infelizmente, Writing's On The Wall não agrada. A letra é boba e sentimentaloide (assim como o próprio filme, de certa forma) e a forma como Sam Smith canta incomoda de um jeito absurdo. Talvez seja uma música até interessante, mas não combina com o novo Bond. O conceito do polvo, utilizado na abertura para representar a figura de Spectre, é muito bom, mas se perde entre os momentos em que é bem aproveitado e os outros, em que varia entre brega e bizarro.

O filme, sendo escrito a oito mãos, apresenta a inconsistência que espera-se de algo criado com estas condições. Sendo o quarto da "Era Craig", a equipe criativa já tinha muita mitologia estabelecida com a qual poderia trabalhar. O resultado foi um filme baseado em sentimentos amorosos, corporações onipresentes, relações com o passado de Bond e a incompatibilidade do modus operandi da Iniciativa 00 com o século XXI. São várias propostas interessantes e complexas distribuídas de forma aleatória durante as duas horas e meia de filme. Mesmo com a força de vontade que Sam Mendes apresenta em sua direção (que faz questão de deixar claro que é muita, em vários planos bastante inventivos), fica difícil de defender.

O grande mistério de 007 contra Spectre, como o próprio título sugere, é a organização que toma o formato de um polvo e tem tentáculos por trás de todas as esferas da sociedade, que já é parte da galeria de vilões clássicos do Bond. Isso permite a criação de um fio condutor, que une todos os vilões dos filmes anteriores. Le Chiffre, Mr. White e Silva são associados desta organização, que toma uma forma parecida com a dO Sindicato, vilão de Missão Impossível: Nação Secreta. E as semelhanças não param por aí. A mesma discussão sobre a eficácia da organização para a qual o mocinho trabalha frente às tecnologias do Século XXI também é repetida aqui. Parecem duas versões com níveis totalmente diferentes de qualidade partindo de um mesmo argumento.


A diferença de Spectre está justamente na megalomania de seus roteiristas e as apostas que fazem em seu vilão, interpretado por Christoph Waltz. Não bastando ser o líder de uma organização que está por trás de todos os outros vilões e até mesmo da MI6, alguém decidiu que seria uma ótima ideia que ele tivesse uma relação pessoal com o passado do próprio Bond, transformando totalmente as suas motivações e trajetória e diminuindo seu caráter a um nível bobo e desnecessário. Mais um famoso caso de "menos é mais".

Aliás, Oberhauser não é o único a apresentar motivações pífias. Todas as personagens parecem estar submetidas a algum tipo de alucinógeno que as obriga a tomar ações que não fazem o menor sentido dentro de sua construção. Um exemplo disso é a nova bond girl (sinceramente, como essa tradição ainda existe?), que aparenta ter menos da metade da idade de Daniel Craig e declara seu amor por ele pouco tempo depois de se conhecerem. Calma aí, minha filha! Além das ações das personagens, alguns dos próprios eventos que movem a trama não fazem sentido algum para o espectador, a não ser pela desculpa de que deveria haver uma cena de ação em determinado momento. Vide a luta dentro do helicóptero, que estraga a cena de entrada do filme.

A parte técnica, como já mencionado, mostra interesse em amenizar as falhas que o texto traz. A direção de Sam Mendes é inspirada e inventiva, trazendo planos-sequência, mudanças de eixo na câmera e vários outros artifícios visuais que melhorem a interface entre a trama e o espectador. A trilha sonora, também, é muito boa e funciona de forma orgânica com o que está sendo mostrado. Destaque para a forma como Thomas Newman encaixa os acordes clássicos do tema de James Bond em momentos-chave da trilha.

007 contra Spectre, em sua confusão, pode proporcionar diversão aos que procuram um filme de ação com "um plus a mais", mas parecerá repetitivo aos olhos dos que já assistiram ao Missão Impossível: Nação Secreta e ainda cheio de falhas aos que pretendem ver uma trama envolvendo James Bond tão interessante quanto foi Skyfall. Se perde tentando agradar ao mesmo tempo os fãs dos filmes antigos e os que gostariam de ver a franquia se adaptar melhor à nova década. Entre gregos e troianos, o filme fica tão perdido quanto suas personagens.

"Você é uma pipa dançando em um furacão, senhor Bond."
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